Caixa confirma plataforma de apostas online e projeta faturar R$ 2,5 bilhões anuais, ignorando o repúdio do Idec.

A Caixa Econômica Federal, instituição que há mais de 160 anos simboliza a presença social do Estado brasileiro, confirmou planos de lançar sua própria plataforma de apostas online, popularmente conhecida como bet. A iniciativa, vista como uma “contradição profunda” pelo Instituto de Defesa do Consumidor (Idec), surge como uma tentativa de equilibrar a arrecadação do banco, que tem visto suas receitas com loterias tradicionais caírem.
O presidente da Caixa, Carlos Antônio Vieira, confirmou que a plataforma deve estrear até o final de novembro, com a projeção de arrecadar entre R$ 2 bilhões e R$ 2,5 bilhões já em 2026.
O Abandono da Missão Social
A decisão da Caixa tem gerado uma onda de críticas por colocar o banco público — guardião do FGTS, gestor do Bolsa Família e agente financeiro da habitação popular — no mesmo mercado de empresas que lucram com o vício e o endividamento.
Em nota de repúdio, o Idec foi categórico: “É inaceitável que a mesma plataforma que deveria estimular a poupança e o crédito responsável se transforme em isca para o endividamento e a ludopatia”. Para a entidade, o banco está “negando sua missão em nome da arrecadação e invertendo o princípio de que um banco público existe para proteger o cidadão, não explorá-lo”.
A oposição no Congresso também se manifestou, com a senadora lamentando que o movimento representa “talvez um dos maiores retrocessos morais e sociais da história recente do país”.
O principal argumento da Caixa para entrar no mercado é de caráter estritamente financeiro: recuperar parte das receitas perdidas com a queda das loterias convencionais. A plataforma da Caixa, que exigirá cadastro rigoroso, documentos e biometria facial, foi autorizada sob uma análise formal e técnica pela Secretaria de Prêmios e Apostas (SPA) do Ministério da Fazenda.
Ainda que a operação da “bet da Caixa” deva ocorrer tanto em canais digitais quanto nas casas lotéricas, o Idec argumenta que a priorização do aplicativo de apostas pode “esvaziar” a rede de lotéricas, que em muitos municípios, como Patrocínio (MG), servem como a única referência bancária para os consumidores mais vulneráveis, idosos e aposentados.
Pressão Política e Medidas de Contenção
A repercussão negativa é tamanha que o próprio Presidente Luiz Inácio Lula da Silva reclamou do plano e convocou o presidente da Caixa para uma reunião, sinalizando que o lançamento pode ser reavaliado. Paralelamente, o governo busca dobrar a taxação das bets de 12% para 24%.
Em uma tentativa de conter o risco social, a Caixa deve cumprir a norma federal que impede o cadastro e o acesso de beneficiários do Bolsa Família e do Benefício de Prestação Continuada (BPC) aos sites de apostas. Contudo, esta medida, que é obrigatória a todas as bets regulamentadas, não foi suficiente para apaziguar a crítica ética, que questiona a própria decisão de um banco social legitimar e incentivar o jogo de azar.